Journal De Bruxelles - Orangotango selvagem curou ferida com unguento que ele preparou, dizem cientistas

Orangotango selvagem curou ferida com unguento que ele preparou, dizem cientistas
Orangotango selvagem curou ferida com unguento que ele preparou, dizem cientistas / foto: MOHD RASFAN - AFP/Arquivos

Orangotango selvagem curou ferida com unguento que ele preparou, dizem cientistas

Um orangotango-de-sumatra, que sofreu um ferimento na face, se curou aplicando um unguento preparado por ele próprio ao mastigar uma planta medicinal, na primeira observação de um comportamento deste tipo em um grande símio vivendo na natureza, reportou a revista Scientific Reports nesta quinta-feira (2).

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Rakus, com cerca de 30 anos, tinha um ferimento aberto abaixo do olho direito, ao longo das fossas nasais, uma lesão provocada "provavelmente por uma briga com outro orangotango macho", explicou Isabelle Laumer, primatologista do Instituto Max Planck e principal autora do estudo.

O orangotango faz parte de um grupo de 130 congêneres, todos não domesticados, sujeitos à observação no parque nacional indonésio de Gunung Leuser.

Três dias depois de sofrer a lesão, Rakus começou a mastigar folhas de um cipó chamado Akar Kuning (Fibraurea tinctoria) mas, ao invés de ingeri-lo, pôs o sumo da planta sobre o ferimento aberto e o cobriu completamente com a polpa do cipó.

Cinco dias depois, o ferimento fechou e após duas semanas, deixou apenas uma cicatriz aparente.

O medicamento usado faz parte da farmacopeia tradicional da região, da China ao sudeste asiático.

Graças a suas propriedades antibacterianas e anti-inflamatórias, este cipó e outros similares "são usados como medicamentos tradicionais para diferentes doenças, como a malária", segundo a bióloga citada.

Trata-se do primeiro "caso documentado de tratamento de uma lesão por um animal selvagem com uma espécie de planta que contém substâncias biológicas ativas", destacou o estudo.

Se for confirmado mediante outras observações, este caso integraria uma lista crescente de comportamentos de automedicação de animais, especialmente primatas.

Na década de 1960, a primatologista Jane Goodall observou pela primeira vez que os chimpanzés consumiam folhas cuja função antiparasitária foi revelada posteriormente.

Esse mesmo comportamento foi observado desde então em bonobos e gorilas, que selecionam cuidadosamente as plantas a ingerir e cujo conhecimento seria passado pelas fêmeas.

- Coincidência ou comportamento intencional? -

Mais recentemente, os pesquisadores observaram orangotangos-de-bornéu, também silvestres, mastigando folhas de uma planta medicinal antes de friccionar suas extremidades. A Dracenea cantleyi é usada pelas populações indígenas para tratar dores musculares e articulares.

O estudo considera que o comportamento de Rakus, assim como o de seus congêneres de Bornéu, foi intencional. Um tratamento repetido e meticuloso de uma parte específica do corpo, "que levou um tempo considerável", segundo Isabelle Laumer.

A doutora Caroline Schuppli, coautora do estudo, não exclui a possibilidade de uma "inovação individual" de origem acidental.

Rakus poderia ter aplicado sem querer o sumo da planta sobre o ferimento, logo após ter levado os dedos à boca. Como a planta tem efeito analgésico, os símios "podem sentir um alívio imediato, o que os levaria a repetir a operação várias vezes", segundo esta encarregada do grupo Desenvolvimento e Evolução Cognitiva no Max Planck.

Como este comportamento não foi observado até agora em nível local, a pesquisadora não exclui que esteja presente na região de origem de Rakus, pois os orangotangos jovens abandonam sua área natal após a puberdade.

O fato de, assim como os seres humanos, os primatas poderem tratar ativamente uma lesão desta maneira sugere que "nosso último ancestral comum já usava formas similares de tratamento com unguentos", afirma Schuppli.

W.Dupont--JdB