Médicos franceses falam sobre situação 'indescritível' dos hospitais em Gaza
Dois médicos franceses, que trabalharam por várias semanas no hospital europeu de Gaza, relatam sua experiência, operando em condições "terríveis", com escassez de antissépticos e entre pacientes gritando de dor.
"Não há mais recursos para garantir a assepsia (prevenção de doenças infecciosas) de um serviço hospitalar", afirmou na segunda-feira o dr. Khaled Benboutrif, médico de emergência francês, que trabalhou no sul da Faixa de Gaza entre 22 de janeiro e 6 de fevereiro com a associação Palmed, especializada na ajuda aos palestinos.
"Não havia macas (...) tivemos que atender os feridos graves no chão", disse o médico durante uma entrevista coletiva em Marselha, no sul da França.
Seu colega Pascal André, infectologista, observou entre 8 e 22 de fevereiro que "muitos pacientes estavam com graves infecções pós-operatórias", porque o local "não estava suficientemente limpo" devido à falta de antisséptico.
"Estamos diante de uma situação indescritível, injustificável", declarou o médico francês.
A guerra na Faixa de Gaza começou após o ataque sem precedentes de 7 de outubro do movimento islamista palestino Hamas no sul de Israel, quando 1.160 pessoas foram assassinadas, a maioria civis, segundo uma contagem da AFP baseada nos dados divulgados pelas autoridades israelenses.
A operação militar israelense iniciada em represália no território palestino deixou mais de 31.800 mortos até o momento, a maioria civis, segundo o Ministério da Saúde do território, governado pelo Hamas.
"As cirurgias acontecem em condições terríveis porque as pessoas não conseguem lavar-se de maneira correta", disse André.
- Mortes "evitáveis" -
Outra dificuldade é que muitas pessoas deslocadas pelos combates se refugiaram “nos corredores, nas salas de espera, nas escadas” e até nos “elevadores” do hospital, disse Benboutrif.
"Eu vi na sala de reanimação alguns pacientes entubados pela boca, com ventilação e que estavam com os olhos abertos porque não havia medicamento suficiente", recorda o dr. André.
Muitos caminhões com ajuda humanitária estão bloqueados na fronteira com o Egito.
Israel controla o acesso da ajuda terrestre no território, que entra a conta-gotas e é insuficiente para as necessidades dos 2,4 milhões de habitantes, que estão à beira da fome, segundo a ONU.
André conta que alguns pacientes "gritavam porque não havia anestésicos" e que aqueles com doenças de longa duração não tinham medicamentos.
Em fevereiro, ele viu uma jovem mãe morrer "porque não teve acesso ao tratamento para diabetes".
"São mortes totalmente evitáveis sobre as quais não se fala, que não são contabilizadas", lamentou.
Além das pessoas feridas pelos bombardeios, o dr. Benboutrif disse que as emergências recebem "muitas vítimas de franco-atiradores".
"Está claro que estavam atirando nas crianças. Era bem direcionado, bem calculado", comentou o médico, ao mencionar o caso de uma menina de 11 anos que ficou tetraplégica após levar um tiro na coluna cervical.
A.Parmentier--JdB