Presidente da Coreia do Sul recua e revoga lei marcial após rejeição do Parlamento
O presidente da Coreia do Sul anunciou nesta terça-feira (4), madrugada de quarta-feira pelo horário local, que revogará a lei marcial, depois que o Legislativo se posicionou contra a medida decretada horas antes pelo mandatário, para, segundo ele, proteger o país das "forças comunistas" norte-coreanas.
O presidente Yoon Suk Yeol recuou após o Legislativo, onde a oposição tem maioria, votar contra o surpreendente decreto aprovado pelo executivo horas antes, o qual gerou preocupação na comunidade internacional, especialmente nos Estados Unidos, um importante aliado de Seul.
"Há pouco, a Assembleia Nacional pediu que fosse levantado o estado de emergência, e retiramos os militares que estavam em operação sob a lei marcial", declarou Yoon em um discurso televisionado às 4h30 pelo horário local (16h30 de terça-feira pelo horário de Brasília).
"Aceitaremos o pedido da Assembleia Nacional e levantaremos a lei marcial em uma reunião de gabinete", afirmou.
O mandatário conservador do Partido do Poder do Povo anunciou a decretação da lei marcial no contexto de um confronto com a oposição sobre o orçamento, após mais de dois anos de um governo marcado por baixos índices de popularidade.
A decisão foi contestada logo depois por meio de uma votação na Assembleia Nacional, e o chefe da oposição, Lee Jae-myung, instou a população a se manifestar em frente ao Parlamento, que foi isolado.
É a primeira vez em 40 anos que a Coreia do Sul aplica a lei marcial. O subsecretário de Estado norte-americano, Kurt Campbell, afirmou que Washington estava acompanhando os acontecimentos "com grande preocupação".
A Casa Branca afirmou não ter sido notificada "com antecedência" sobre a aprovação de uma lei marcial na Coreia do Sul, onde os Estados Unidos mantêm cerca de 28.500 soldados para fazer frente à Coreia do Norte e ao seu programa armamentista.
Os manifestantes posicionados em frente ao Parlamento celebraram a decisão de Yoon de reverter o decreto, após um dia tenso marcado pelo destacamento de militares.
- "Eliminar os elementos antiestatais" -
O presidente não detalhou as ameaças de Pyongyang, mas seu país segue tecnicamente em guerra com a Coreia do Norte, que está em uma corrida para se equipar com armas nucleares.
Após o anúncio, todas as atividades políticas foram proibidas, e os meios de comunicação passaram a estar sob controle governamental, informou o chefe do exército, Park An-su, em um comunicado.
Vários helicópteros pousaram no telhado do Parlamento em Seul, conforme imagens ao vivo transmitidas pela televisão.
O líder da oposição chamou a lei marcial de "ilegal" e pediu que a população se concentrasse em frente ao edifício.
Apesar do destacamento militar, cerca de 190 deputados conseguiram entrar no edifício, onde votaram unanimemente a favor de uma moção que bloqueou a aplicação da lei marcial e pediu seu levantamento.
A Constituição da Coreia do Sul estipula que a lei marcial deve ser levantada se uma maioria do Parlamento assim o solicitar.
Yoon venceu as últimas eleições em 2022 por uma margem estreita, diante do líder da oposição.
O presidente recorreu a essa manobra devido ao confronto entre seu partido e o principal partido opositor, o Partido Democrático, sobre o projeto de orçamento para o próximo ano.
Os deputados da oposição, que têm maioria na câmara de 300 assentos, aprovaram na semana passada um plano orçamentário significativamente reduzido.
Yoon acusou os legisladores da oposição de cortar "todos os orçamentos-chave para as funções fundamentais do país, como o combate aos crimes relacionados às drogas e a manutenção da segurança pública".
Também os acusou de serem "forças antiestatais que tentam derrubar o regime".
Vladimir Tikhonov, professor de estudos coreanos na Universidade de Oslo, afirmou que a medida de Yoon de impor a lei marcial é "uma tentativa de retroceder na história", em referência à ditadura que terminou no final da década de 1980.
"Não acredito que a sociedade civil sul-coreana possa continuar reconhecendo Yoon como presidente legítimo", declarou à AFP.
A.Martin--JdB