Extrema direita da Europa enfrenta obstáculos para chegar ao poder
O fracasso de Geert Wilders para se tornar o primeiro-ministro dos Países Baixos simboliza as dificuldades de formar coalizões majoritárias de extrema direita na Europa, apesar de ter conseguido romper seu isolamento e chegar ao poder em vários países.
Na Itália, a pós-fascista Giorgia Meloni lidera um governo de coalizão com ultradireitistas e a tradicional formação de centro-direita, enquanto a Hungria tem como homem forte o nacionalista conservador Viktor Orban.
A formação anti-imigração Partido dos Finlandeses ocupa sete ministérios em um governo liderado pela centro-direita na Finlândia, e os ultranacionalistas do SNS possuem três pastas no Executivo com partidos de centro-esquerda na Eslováquia.
Esse panorama inimaginável nos anos 2000, quando uma coalizão na Áustria entre a direita e um partido ultradireitista desencadeou uma crise política na Europa, completa-se com o apoio parlamentar do partido SD (nacionalista) ao governo conservador na Suécia.
"Nos anos 2000 não estavam normalizados. Agora, estão e, em alguns países, são a principal força como na Itália, Hungria e, há até pouco tempo, na Polônia", assegura Ignacio Molina, pesquisador do centro de reflexão espanhol Real Instituto Elcano.
"Em alguns casos se moderaram, mudaram o discurso. Tem uma narrativa muito clara contra a imigração, sobre a defesa das tradições, mas não se afirmam como antidemocratas" e não defendem mais "sair da União Europeia", acrescenta o especialista.
- Um "cordão sanitário" frouxo -
Na França e Alemanha, as duas principais economias do continente, as formações ultradireitistas também estão em ascensão, assim como em outras nações como Portugal, onde, no último domingo, o partido Chega duplicou seus votos nas eleições legislativas.
Mas em um continente que enfrenta mais de 15 anos de crise - crise da dívida, dos refugiados, pandemia e efeitos econômicos da guerra na Ucrânia -, os melhores resultados da extrema direita nem sempre se traduzem no poder.
Os partidos tradicionais na Europa costumam aplicar o chamado "cordão sanitário" para isolar formações consideradas extremistas, mas isso só é possível se "duas condições" forem dadas, segundo o cientista político Gilles Ivaldi.
Uma maioria de eleitores deve ver "esses partidos como perigosos para a democracia" e seus resultados eleitorais devem ficar abaixo dos 15% dos votos, aponta o especialista do centro Cevipof, da universidade francesa Sciences Po.
O exemplo mais recente é os Países Baixos. Wilders, que ganhou as legislativas de novembro, desistiu, na quarta-feira, de ser primeiro-ministro de uma coalizão de partidos de centro e direita e o país caminha para um possível governo de tecnocratas.
"Só posso me tornar primeiro-ministro se TODOS os partidos da coalizão me apoiarem. Não foi o caso", lamentou o líder ultradireitista na rede social X, reiterando seus lemas: "menos asilo e imigração" e os holandeses, "primeiro".
- Risco para a direita -
"Wilders forjou uma identidade de ser a pessoa que está contra os compromissos moderados", necessários para ser primeiro-ministro, explica o analista do Real Instituto Elcano, que acredita que isso prejudicou sua imagem como "interlocutor válido".
Mas esse tradicional isolamento começou a rachar em uma Europa onde as ideias de extrema direita, sobretudo, para controlar a imigração são adotadas por países governados por centristas (França) e também social-democratas, como na Dinamarca.
A legitimação dessas ideias também coloca os partidos da direita tradicional diante do dilema de compactuar com a extrema direita para formar governo, um movimento não isento de riscos, segundo os especialistas.
Molina dá como exemplo o caso da Espanha, os rápidos acordos regionais e municipais do Partido Popular (direita) com o ultradireitista Vox prejudicaram seus resultados nas legislativas e suas possibilidades de chegar ao governo nacional.
Além disso, se os partidos de direita tentam responder as preocupações sobre "a imigração e a segurança" retomando as ideias ultradireitistas, "isso sempre acaba beneficiando a extrema direita", acrescenta Ivaldi.
P.Mathieu--JdB