Journal De Bruxelles - Sindicatos da Argentina fazem primeira demonstração de força contra reformas de Milei

Sindicatos da Argentina fazem primeira demonstração de força contra reformas de Milei
Sindicatos da Argentina fazem primeira demonstração de força contra reformas de Milei / foto: Luis ROBAYO - AFP

Sindicatos da Argentina fazem primeira demonstração de força contra reformas de Milei

Os sindicatos da Argentina fizeram, nesta quarta-feira (24), sua primeira demonstração de força contra o ajuste econômico e as reformas impulsionadas pelo governo do ultraliberal Javier Milei, com uma greve geral e protestos que reuniram dezenas de milhares de pessoas em todo o país.

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Sindicatos de azeiteiros, jornalistas, trabalhadores da cultura, de hospitais, da ciência, além de membros de associações de bairro, de defesa dos direitos humanos e outros setores participaram da manifestação em Buenos Aires, exibindo cartazes com as frases "A pátria não se vende", "Não ao apagão cultural" e "Ciência ou terraplanismo".

"Vim apenas para me solidarizar com os trabalhadores e os aposentados porque querem destruir nossos direitos, temos que detê-los", disse à AFP Andrés Divisio, um aposentado de 71 anos que caminhava com um cartaz que dizia "Somos a casta que tem caspa. Milei, fraudador".

Durante o ato central do protesto em frente ao Congresso Nacional, o sindicalista Pablo Moyano fez uma dura advertência ao ministro da Economia, Luis Caputo: "Se continuar com estas medidas, os trabalhadores vão carregar o ministro nos ombros para jogá-lo no Riachuelo", rio que demarca a fronteira sul de Buenos Aires.

Moyano fez alusão a um comentário de Milei, que está há apenas 45 dias no poder e havia dito que, se a inflação em janeiro fosse menor que 30%, seria preciso "carregar [Caputo] nos ombros". Este, por sua vez, escreveu na rede social X que esperava que "a Justiça se envolva no assunto" pelo comentário do sindicalista.

O protesto foi convocado pela maior central sindical da Argentina, a Confederação Geral do Trabalho (CGT), de viés peronista, em repúdio, em particular, às mudanças por decreto do regime de trabalho impulsionadas por Milei, que limitam o direito à greve e afetam o financiamento dos sindicatos.

Desde que Milei assumiu o poder, fixou como objetivo conter a inflação galopante com base em dois grandes projetos: um Decreto de Necessidade e Urgência (DNU), que espera confirmação parlamentar ou judicial, e a chamada "lei ônibus".

Juntos, os dois pacotes somam mais de mil medidas, que buscam revolucionar o sistema econômico argentino, levando a ideia do livre mercado a praticamente todos os setores. Entre outras mudanças, revogam as regulações dos aluguéis, favorecem as privatizações e reduzem fortemente o financiamento da cultura e da ciência.

"Pedimos aos deputados que tenham dignidade e princípios, que não traiam os trabalhadores e a doutrina do peronismo, que é defender os que menos têm", disse o segundo orador, Héctor Daer, da CGT.

A greve geral foi acompanhada pela Confederação de Trabalhadores Argentinos (CTA), a segunda em tamanho, à qual se somaram em seguida sindicatos e organizações de defesa dos direitos humanos, como as Avós e as Mães da Praça de Maio.

O protesto se espalhou para todas as capitais do país, com manifestações que reuniram milhares de grevistas em Corrientes, Rosario, Córdoba, Mendoza, Tucumán e Mar del Plata, entre outros pontos.

- 'Sindicalistas mafiosos' -

Em uma postagem na rede X, a ministra da Segurança Patricia Bullrich qualificou os organizadores do protesto de "sindicalistas mafiosos, gerentes da pobreza", e atacou os "juízes cúmplices e políticos corruptos, todos defendendo seus privilégios" ante as reformas impulsionadas por Milei.

"Querem nos levar todos presos, não criminalizem o protesto porque vai lhes custar caro", disse Daer a esse respeito em seu discurso.

Na Avenida 9 de Julho, no centro da capital, houve alguns episódios de tensão quando a polícia tentava liberar faixas ao trânsito, adotando um novo e polêmico protocolo que regula os protestos.

O número de manifestantes sobrecarregou os controles apesar de a Polícia ter cortado o principal acesso sul à capital.

O protesto se estendeu, mas em escala muito menor, para várias capitais do mundo. Cerca de 50 pessoas se reuniram diante da embaixada da Argentina em Madri com bandeiras azuis e brancas e cartazes que diziam "A pátria não se vende, se defende" e "Milei, a casta é você".

Também houve atos convocados em Montevidéu, Londres, Berlim e Paris, entre outras cidades.

A estatal Aerolíneas Argentina, maior companhia aérea do país, se somou à greve e cancelou todos os voos.

"Estou indignado, já perdi dinheiro vindo para cá e com a diária de hotel", disse à AFP Sergio González no aeroporto doméstico Jorge Newbery.

- Primeiro desafio -

"A Argentina tem uma sociedade civil muito articulada, muito organizada", disse à AFP Iván Schuliaquer, cientista político da Universidade Nacional de San Martín. "E essa capilaridade política que existe na Argentina é muito forte e, de forma muito clara, está em geral mobilizada contra Milei".

Embora as pesquisas mostrem que ele tem entre 47% e 55% de imagem positiva, também indicam uma queda em relação aos 55,7% dos votos que obteve ao vencer as eleições. Para Schuliaquer, isso indica que a "lua de mel" está acabando, enquanto se vê "um forte anti-mileísmo já articulado".

Segundo o governo, as medidas de ajuste vão servir para conter uma inflação anual de 211%, recorde em 30 anos.

Além disso, a depreciação do peso em 50% e a liberação do preço dos combustíveis, entre outras medidas do novo presidente, reduziram fortemente o poder aquisitivo de assalariados e aposentados.

T.Peeters--JdB